O Balé Nacional Russo esteve em
Fortaleza esta semana, o que me fez lembrar de um pequeno perrengue que
passamos em Moscou.
Viajamos para a capital russa em
2010,
sem excursão, sem guia e sem falar russo, pelas terras gélidas dos czares.
Preparando o roteiro, cismei que
queria assistir a um balé. Ir à Rússia e não ver um espetáculo de balé seria
como ir a Roma e não ver o Papa.
Pesquisei e no período em que
iríamos só havia óperas em cartaz. Nada de balé.
Quinze dias antes de viajar
apareceram, nos sites que eu estava buscando, ingressos para o balé Bolshoi,
para o espetáculo Dom Quixote. No Teatro do Kremlin, já que o Teatro Bolshoi
estava em reforma.
Não hesitei e comprei os ingressos. E lá fomos nós passar frio na Rússia.
Na data do espetáculo, passeamos
durante todo o dia e voltamos para o hotel apenas para trocar de roupa. O balé
começaria às 19:00.
Saímos do hotel com alguma
antecedência, e pegamos um táxi rumo ao Kremlin.
Ao pegar o táxi e soltarmos um “Good
Evening”, sentimos logo que o motorista, a exemplo de boa parte da população
russa, não falava inglês. E nós, como significativa parcela do povo brasileiro,
não falávamos nada de russo.
Ingresso do balé |
Mostramos os ingressos e, mímica
vai, mímica vem, partimos.
O motorista nos deixou no Kremlin,
prédio gigantesco que, segundo o Wikipedia, tem 24.000 metros quadrados.
Lépidos e fagueiros, fomos até a
primeira portaria que encontramos, a poucos passos. Entregamos nossos ingressos
para um guarda, que tampouco falava inglês. Ele viu nossas entradas e começou a
fazer gestos, que para bom entendedor significavam “do outro lado”.
Claro, do outro lado. De um prédio
de 24.000 metros quadrados. Nosso taxista, óbvio, já havia sumido. A noite caía
e o frio aumentava.
Começamos a caminhar, depois de
um dia exaustivo, e com sobretudos bem pesados. Havia a esperança de nos
depararmos com alguma entrada logo que dobrássemos a esquina.
Viramos a esquina e nada. Apenas
um muro gigantesco. E o tempo passando. Meu irmão, o detentor de mais fôlego
do grupo, começou a correr. Depois começamos a correr atrás dele. E nenhuma
portinha aparecia por entre as saliências da muralha.
Depois de mais de 40 minutos entre
caminhada e corrida, avistamos grandes portões. Não era miragem. Era ali. Entramos
e os portões foram trancados atrás de nós. Ou seja, mais um minuto e todo o
esforço teria sido em vão.
O espetáculo, claro, já havia
começado. Apresentamos nossos ingressos e fomos encaminhados para umas cadeiras
na lateral do teatro. Só poderíamos ir para nossos assentos após o intervalo.
Sentamos nas confortáveis poltronas
do Teatro do Kremlin. Luzes apagadas e refletores apenas no palco, onde
bailarinos faziam jus à fama de melhor corpo de balé do mundo.
Uma música calma conduzia os
artistas. Na plateia, nós, turistas brasileiros exaustos.
Não preciso dizer que, 10 minutos
depois, meus companheiros de viagem contribuíram para a orquestra, com sons
agudos de roncos.
Não me juntei ao coro. Mais do que qualquer outra coisa, o medo de sermos expulsos do
teatro me fez apreciar, atenta e silenciosamente, tão bela arte.